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#ElasCientistas II: Marie Curie


Num período conturbado de sua história, Marie Curie, nascida Maria Salomea Skłodowska, disse: “Devo agir de acordo com minhas convicções” e foi dessa forma que levou os 66 anos de sua vida. Talvez isso, unido ao seu brilhantismo e pioneirismo, lhe trouxeram o reconhecimento e prestígio que nem sempre acompanha o caminho de mulheres que se dedicam à ciências e a matemática.


Em 2018 foi eleita como a mais influente da história pelos leitores da revista BBC History, ficando em primeiro lugar numa lista de cem mulheres que mudaram o mundo. Em 1920 no aniversário de 25 anos do descobrimento do elemento Rádio o governo francês lhe pagou uma remuneração pelo feito, uma espécie de prêmio que havia sido concedida antes para Louis Pasteur.


Sendo prestigiada aonde quer que fosse, Marie Curie pisou desde a Casa Branca à universidades brasileiras. Fez história sendo a única, até hoje, com dois Prêmios Nobel em áreas distintas da ciência. Contribuiu para física, química e medicina, mas teve de longe o que podemos chamar de “vida fácil”, Curie nunca teve nada ao seu favor, na verdade.


A mais nova entre cinco irmãs, nasceu numa época em que a Polônia era dominada pelo Império Russo czarista. Sua família, envolvida em levantes contra a dominação russa, perdeu sua fortuna e propriedades. Com dez anos de idade, ainda, sua mãe e irmã faleceram uma seguida da outra. Sem muita perspectiva após ter terminado o equivalente ao ensino médio, passou um tempo com familiares no interior, retornando um ano depois para Varsóvia, quando começa a trabalhar como tutora. Seu pai, professor de física e matemática, incentivava suas filhas nos estudos, mas a única alternativa para polonesas no contexto vivido era a chamada Universidade Volante, uma instituição de ensino secreta que recebeu esse nome por constantemente mudar seu lugar de encontro, já que atuava ilegalmente, desafiando o regime russo.


Nesse período a França seguia na direção oposta de muitas nações e impérios, permitindo o ingresso de mulheres em muitas de suas universidades, atraindo interesse de jovens estrangeiras como o caso de Bronisława: que com o auxílio financeiro proporcionado por sua irmã por meio de um acordo de ajuda mútua entre elas, se mudou para Paris para estudar medicina enquanto Marie permaneceu na Polônia trabalhando de governanta. Um ano antes de finalmente ingressar na Universidade de Paris, ela teve contato com o laboratório através de seu primo que lecionava na Universidade Volante e que havia sido aluno de Mendeleev. Graduou-se em Ciências Físicas e logo depois em Ciências Matemáticas e envolveu-se com pesquisa sobre as propriedades magnéticas dos materiais. Foi nesse período que conheceu Pierre Curie, já renomado cientista francês e, não muito tempo depois, casou-se com ele.


Em 1895, num laboratório alemão, Wilhelm Roentgen descobre o Raio-X. Um ano depois, na França, Henri Becquerel se depara com um fenômeno curioso: uma placa fotográfica com sais de urânio é marcada sem ser exposta à luz solar. O urânio é capaz de emitir um tipo de irradiação até então desconhecida. Marie decide iniciar, então, seus estudos de doutoramento nessa área sendo orientada por Becquerel e publica em 1898 o artigo “Raios emitidos por Uranium e Thorium” onde estuda uma variedade da uranita chamada de pechblenda. Esse estudo culminou na descoberta do Polônio e, posteriormente, do Rádio, isso porque a radiação encontrada era muito maior do que a esperada do elemento Urânio contido no minério, o que sugeria a existência de novos elementos.


Foi apenas em 1903, após refinar oito toneladas da pechblenda, obtendo uma única grama de Rádio para que fosse possível calcular a massa atômica do elemento que ela concluiu sua tese e finalmente pôde defendê-la e obter o título de Doutor em Física, a primeira mulher com esse título na França. O trabalho sobre radioatividade feito junto a Pierre Curie e Becquerel recebeu o reconhecimento através do Nobel de Física no mesmo ano, e Marie Curie se tornou então o primeira mulher laureada com o prêmio.


Em 1906 Pierre Curie morreu prematuramente vítima de um acidente de trânsito. Após meses de isolamento, Marie voltou a ativa e conseguiu a cadeira de seu agora falecido marido na Escola de Sèrvres, sendo a primeira mulher a lecionar na instituição.


Ela continuou estudando as propriedades químicas do polônio e do rádio e, em 1911, em meio a um escândalo proporcionado pelas mídias conservadoras de Paris, Marie Curie ganhou o Nobel de Química. (Linus Pauling também foi contemplado com dois nobels, porém, um deles foi o Prêmio Nobel da Paz). A academia sugeriu que ela não fosse buscar o prêmio, temendo o escândalo envolvendo seu nome: alguns jornais europeus publicaram a troca de cartas entre ela e Paul Lagenvin, um ex-aluno casado de Pierre, retratando-a como a “estrangeira destruidora de lares”. Sobre isso, Marie não ficou calada, respondeu: “Eu devo agir de acordo com minhas convicções. Acredito que não há relação entre meu trabalho científico e o que dizem sobre minha vida particular essas publicações de segunda categoria. Quando receberem esta carta, eu estarei pronta para estar em Estocolmo no momento da cerimônia”. E assim foi feito.


Quando a Primeira Guerra Mundial estourou, Marie Curie inventou ambulâncias radiológicas, chamados de Petit Curie, ajudando no prognóstico de soldados e salvando vidas. Posteriormente, se dedicou a divulgação dos fenômenos envolvendo radioatividade para que conseguisse fundos para criar o Instituto de Radio de Paris, com físicos, químicos e médicos, voltando sua pesquisa ao uso de isótopos radioativos para o tratamento de câncer. O instituto teve início em 1919.


Não muito mais tarde, sua saúde começou a se deteriorar, em dezembro de 1933 foi diagnosticada com colecistite. Marie desconfiava que talvez a manipulação dos elementos radioativos eram a possível causa da doença. Em julho do ano seguinte morreu de anemia perniciosa aplásica, atualmente acredita-se que o quadro tenha sido causado por uma leucemia induzida pela radiação. Em 1995 o governo francês decidiu transferir seu corpo para o Mausoléu Nacional da França e foi verificado que muito provavelmente sua doença foi causada pela exposição à Raios-X durante a Primeira Guerra Mundial e não a manipulação de elementos radioativos em laboratório.


Marie Curie deixou um grande legado para ciência. Como pessoa, ainda inspira por sua força, certeza e luta.


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